Ele tinha uma vida comum. Simples. Reclamava de muitas coisas, por vezes até da monotonia, da falta de mudança. Mas vivia em paz, dentro de sua rotina egoísta e preguiçosa. Da escola pra casa, de casa pra música ou para o teatro, mas sempre de volta ao lugar que chamava de lar. De volta ao lugar que sempre lhe descansou só pela presença. Pelo sentido intrínseco que exercia sobre ele. Mas tudo estava prestes a mudar. Aquele garoto tão acomodado e egoísta estava prestes a mudar.
- Onde estou? - ele se perguntou.
Olhou a sua volta e via seus móveis, seus eletrodométicos, seu travesseiro...tudo que lhe pertencia á sua volta, ou quase tudo. Observando com um pouco mais de afinco o jovem se viu em um lugar completamente diferente do que ele deixara antes do chochilo. Será que estava sonhando, afinal? Se estivesse era fantástico...incrivelmente fantástico como era real. Nem em suas melhores fantasias havia sonhado de forma tão vívida. Levantou-se e andou com passos curiosos em busca de alguma explicação para aquele estranho distúrbio. Observou uma cozinha branca com móveis de MDF também brancos e uma pia de mármore com louça por lavar. Se dirigiu ao interior do recinto. Adentrou por um corredor com várias portas. Foi andando pesarosamente refletindo sobre onde o sonho o havia levado. Entrou na primeira porta que viu a direita , afinal achava q a direita sempre dava sorte. Encontrou a cama queen size de seus pais costumeiramente arrumada com sua colcha verde limão e seus travsseiros com babados nas extremidades. Voltou ao corredor achando muito convincente aquele sonho. Decidiu pular a porta seguinte a esquerda, entrando na última a esquerda. Se chocou com sua mesa escrivaninha montada com o computador da família e mais ainda quando viu seus móveis, seu teclado, sua televisão, seu criado-mudo e até sua cama! Seguiu mais á frente até uma janela onde esperava ver aquele varejão e....
- Isso está me assustando!! - disse em voz alta.
O que ele viu era completamente diferente do que estava acostumado. Não havia varejão, não havia a casa de sua avó na esquina da frente, não havia rua movimentada...no lugar estavam ruas posicionadas de forma planejada com árvores entre si e diversas casas baixas e antigas. Ele olhou atentamente e deu um gemido atordoado. Antes que pudesse se virar e retornar ao corredor para correr daquele lugar, veio em sua direção sua mãe.
- Você está bem? Ouvi gritos... - disse ela preocupada.
De repente sua visão começou a falhar...clarões tomavam seus olhos...marteladas consequentes acertavam sua mente...seus ouvidos ficaram surdos e ele não sentiu mais nada. Só o pesar. Só uma força o empurrando com força para baixo. Como se um contêiner estivesse o afundando mar abaixo, sem lhe dar oportunidade de se salvar ou pelo menos tentar. Ele permaneceu imóvel. Só afundando. Nem ele mesmo sabe quanto tempo permaneceu no fundo daquele oceano negro. Nem ele sabe quanto tempo passou preso áquele contêiner. Preso aquela ilusão que o tragou por inteiro. Mas após muito tempo corrido. Algum tipo de guincho o encontrou. Um guincho não muito forte. Não forte o bastante para retirar o contêiner de cima do jovem. Mas sim para permitir que ele veja algo além daquele ferro que lhe havia sufocado. O guincho o possibilitou de olhar ao menos o oceano que o envolvia, que fora da escuridão do contêiner que o amassava não era tão escuro assim. O jovem observou atentamente alguma forma de sair dali...mas o guincho não tinha muito tempo. Ou ele encontrava logo uma forma de sair dalí, ou o guincho não suportaria e o contêiner voltaria q sufocá-lo.
Como um filme tudo passou pela cabeça do jovem. Tudo o que ele pensava ser pra sempre. Em todas as suas crenças, planos e ideais. Pensou que de repente tudo fazia um sentido desagradável. Que tudo que acontecera nos últimos tempos em sua rotina ociosa o havia preparado para isso. Mas ele ignorou os sinais. Seguro de sua potencialidade diante daquela situação. Mas agora o pra sempre se findou.
Talvez isso traga alguma experiência para o garoto. Talvez o melhore como pessoa. Talvez o ensine a viver. Talvez faça algum sentido, em algum momento essa curva brusca.
Talvez dentro desse tão pesado e conturbado contêiner, haja algo além de dor.